Álvaro Macedo

Para espairecer com literatura, músicas, dicas…

Freudiando

Não agüento mais meus recalques. Já não vejo o que ocorre, já não ouço o que ocorre e essa invisibilidade dos detalhes deforma o sentido do todo. Apelo para uma regressão sem sentido, achando que o pranto que um dia resolveu meus pequenos problemas poderá libertar-me dessa prisão de mim mesmo. Desesperado, afasto de mim desejos inconfessáveis, por meio de formações reativas, onde parto para ações absurdamente opostas ao desejo original, escondendo de mim aquilo que me dói admitir. Tento racionalizar minhas atitudes, encontrando explicações convincentes e aceitáveis para justificar meus estados deformados de inconsciência. Não, não é uma simples mentira, não. Simplesmente não estou consciente das deformações de meus pensamentos. A luta continua inglória. Projeto para longe de mim essas coisas indesejáveis, incômodas e espero que outro tome conta delas. Tento reprimi-las, busco esquecê-las, nem que seja à força. Isolo-as ao ponto de acreditar que não são mais minhas. Quando não dá mais e elas se tornam muito aversivas, tento sublimá-las de modo que todos as aceitem. De tanta vontade de esmurrar o mundo, tornei-me boxeador. Cheguei a partir para a negação, mas a simples mentira não convencia a ninguém, quanto mais a mim. Desloquei o foco de meus problemas e meti o pé no pobre do meu cachorrinho, que também se chama Freud (desculpe-me, Sig; é admiração por você e eu gosto tanto dele). Assustado com tanta ameaça que minhas próprias atitudes, pensamentos e desejo me traziam, procurei me esconder, identificando-me com grupos grandes, escondendo-me no anonimato. Mas eles continuavam visíveis por mim. Por mim e pelo superego (terrível fantasma de meus momentos de autocobrança). Criei calosidades nos dedos de tanto bater na madeira, para “isolar” todos esses males, mas a anulação não surtia efeito. Qual o quê! Nada resolvia. Partia para amigos que, idealizados por mim, julgava capazes de tudo resolver. Tomei inúmeros sorvetes, tentando substituir a fonte principal de meus desejos. Expiei todos meus erros, para exorcizar-me de meus demônios interiores. Separei bons do maus, mas a cisão nem sempre era possível, tamanha a intimidade que muitas vezes havia entre eles. Joguei tudo isso no meu terapeuta, que rejeitou de pronto essa transferência, dizendo que a única transferência que ele aceitava era da minha conta bancária para a dele, no justo valor acordado e, a todo custo, tentou contratransferir tudo que lhe havia passado. Fantasiei situações em que meus desejos eram resolvidos, procurei aplicar onde eu era bom para compensar essa minha mediocridade escondida, somatizei meus conflitos numa conversão maldita. Achei que não tinha jeito e entrei em total resistência para o meu terapeuta. Por que mexer em caixa de marimbondos? Vamos deixar lá, bem escondidinhos, todos esses traumas. Afinal, remover as cascas de cebolas sempre nos faz chorar.
Perdoem, por essa minha verborragia, fruto de um superego destraído, de um id cheio de desejos incontrolados e um ego que nunca foi um bom gestor.

quinta-feira, 07.julho.2011 - Posted by | Uncategorized

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